Vale do Parnaíba: historiografia, história e marginalidade

Resumo

Nestas considerações preliminares sobre a história do Piauí, discute-se, em primeiro lugar, a própria noção de racionalidade histórica. Existe História ou existem histórias e qual a sua lógica, se esta de fato existe? No caso, é perfeitamente possível escrever a história do Piauí luso-brasileiro, graças à quantidade e a qualidade das fontes primárias e secundárias. Entretanto, tal história não permite enquadrar o Piauí, como querem certos autores brasileiros, no plano da História hegeliana ou marxista, com suas leis e determinações. De fato, mesmo no plano restrito da historiografia do Nordeste do Brasil, não há suficientes provas para a afirmação, que se faz com freqüência, de que o Piauí devesse ser anexado à sociedade colonial como área de criatório, complementar à economia do açúcar. Não só havia a disponibilidade de outras áreas, como só depois da decadência da produção de açúcar, com a expulsão dos holandeses de Pernambuco, é que o Piauí é efetivamente atingido pela expansão colonial. Mais do que de área complementar, trata-se de território com utilidade econômica não mais que marginal para o conjunto do Nordeste e do Brasil. ******************************************* In this introduction to the history of the state of Piauí, in Northeastern Brazil, the first topic to be discussed concerns the very notion of historical rationality. Is there a History or several histories, with what logic or logics, if any at all? In the nature of the case, it is perfectly possible to write the history of Luso-Brazilian Piauí, thanks to the number and quality of both primary and secondary sources. Vet, this does not entail as a consequence that the history of Piauí could possibly be subsumed, as claimed by some Brazilian authors, in an all-embracing historical scheme, inspired by either Hegel or Marx. In point of fact, there are no proofs for the often-repeated statement that Northeastern Brazilian colonial society necessitated the sttlement of Piauí as a cattle-raising area, in a complementary relationship with the sugar-growing coastal belt. Other areas were already available for cattle-raising, when Piauí was finally conquered by the Luso-Brazilian, late in the XVII century, after the Dutch Wars of Northeastern Brazil, when the culture of sugar carte was already stagnant and needed no fresh supplies of either land or cattle. Rather than being complementary to the regional economy as a whole, Luso-Brazilian Piauí was peripheral to it and its occupation should be explained in terms of its marginal utility and not by historical laws of a general and theoretical kind.